4.6.08

a dor de todas as ruas...

a dor de todas as ruas vazias.

sinto-me capaz de caminhar na língua aguçada deste silêncio.
e na sua simplicidade, na sua clareza, no seu abismo.

mas gosto da noite e do riso de cinzas. gosto do
deserto, e do acaso da vida. gosto dos enganos, da sorte e
dos encontros inesperados.
pernoito quase sempre no lado sagrado do meu coração,
ou onde o medo tem a precaridade doutro corpo.

a dor de todas as ruas vazias.

paraíso sabe-se que chega a lisboa na fragata do alfeite.
basta pôr uma lua nervosa no cimo do mastro, e mandar arrear o velame.

é isto que é preciso dizer:
daqui ninguém sai sem cadastro.

a dor de todas as ruas vazias.

sujo os olhos com sangue. chove torrencialmente. o
filme acabou. não nos conheceremos nunca.

os poemas adormeceram no desassossego da idade.
fulguram na perturbação de um tempo cada dia mais
curto. e, por vezes, ouço-os no transe da noite. assolam-me
as imagens, rasgam-me as metáforas insidiosas, porcas...
e nada escrevo.
o regresso à escrita terminou. ...
- e a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar.

AL BERTO