Da demora... atenta.

(Autor desconhecido)

Se eu soubesse escrever um livro, escreveria certamente sobre a atenção. Ou sobre a sua ausência... Escreveria sobre essa coisa tímida, frágil e imperceptível que passa por entre os dedos de quem vive depressa e de olhar ausente. Falaria da importância da sua presença nos gestos, nas palavras e nos olhares que dispensam legendas e traduções quando se demora a estar. Sobre as cores com que se veste consoante o seu objecto e o seu interesse. Sobre as pregas húmidas e inconscientes que causa no olhar de quem sofre a sua ausência... porque estar desatento é também uma suave forma de traição. Falaria da cor morna com que se enfeita quando se transforma em terna preocupação... como se fosse uma subtil forma de cuidado por quem está à nossa frente e em silêncio, quando tudo nela nos fala do que deseja silenciar. Da cor lúcida que adquire quando se metamorfoseia naquilo que deveria existir sempre em todas as relações humanas: respeito. E gostar de alguém... é respeitar tudo o que a/o constitui. É entender-lhe os gestos, os receios, os silêncios, os tons com que fala, é olhar em perspectiva o tempo que passou por ela/e e o que aí foi deixando. Respeitar é estar atento. É saber que, naquele momento, se está a ser testemunha da vida de alguém nem que seja por 2 minutos. E testemunhar é criar um laço que nos aproxima de alguém que é diferente dos milhões e milhões que pessoas que existem por aí (já dizia Exupéry na boca do Petit Prince). É afirmar que ela existe para nós. É corroborar uma verdade física: que estamos ali para nos demorarmos. Porque estarmos atentos é demorarmo-nos... é escolher e decidir que desejamos demorarmo-nos. Curiosamente, a atenção é, talvez, daquelas coisas que até a pessoa mais pobre pode oferecer. E no entanto, por vezes, ainda conseguimos ser mais pobres e vazios que as pessoas que exigem atenção...