17.10.05

Uma carta que não recebi...

Fernando Monteiro - Duna


Ao ver a chuva cair sinto que esta me pára o tempo... e obriga-me a reviver... de um modo inesperado e amargo um filme feito de memórias. E sem que eu queira... a tua memória aflora à minha pele... como um desejo reprimido que há muitos anos tentei esquecer. E sim... confesso agora, ao fim de tanto tempo, que é verdade que desisti de ti... talvez um pouco antes de ter desistido daquilo que me unia a ti... e eu simplesmente não soube como dizer-te. Não queria dizer-to. Só a certeza de que os teus olhos me diriam que continuavas a amar-me com a mesma intensidade do ínicio dos tempos em que nos encontrámos... em que sonhámos uma vida feita de pequenas coisas... que eram tão poucas mas que nos prendiam tanto uma à outra... A certeza de que os teus lábios me sussurrariam que o teu amor compensaria a falta do meu. Não queria que me amasses mais... e tanto. Queria que me esquecesses. Queria tanto que sentisses que em mim o nosso tempo já havia terminado. Queria que amasses outra pessoa... e que a minha presença na tua vida fosse apenas uma brisa de outono. Mas tu... amavas-me e esse era o meu castigo. Irritavas-me... porque não vias uma verdade que tentei dizer-te nos meus silêncios... nas minhas ausências... nos meus enfados... e foi aí que um dia me ter tornei insensível à tua pessoa, à tua presença. E foi nesse momento que me tornei egoísta perante uma dor que não era minha. Foi nesse momento que fui cobarde perante uma verdade que precisava de ser dita... e não disse. Foi nesse dia que cometi um erro... como se fosse uma recaída consentida num vício antigo e curado que deixamos emergir para afirmar que ele ainda existe em nós. E errei...com a mesma facilidade com que cheguei a casa e retomei todos os meus hábitos... e sim... foi nessa derrota mansa e muda que consenti em esquecer-te. Tentei amar-te... em vão... e por pouco tempo confesso. Tentei amar-te naquele espaço silencioso das memórias de um tempo em que eu sei... talvez que te amei... naquele intervalo incómodo de uma cobrança que eu sentia que vinha de ti. E sim...admito que me enganei... julguei que era amor... e quando soube que nada mais era do que um momento de magia, um momento de um deslumbre tal que não consegui viver com ele... não soube dizer-to. Nem soube libertar-te de mim.

Perdoa-me... pelos sonhos que te dei através do meu olhar. Pela cobardia de não te ter dito que acabou. Pelo silêncio frio e vazio em que te abandonei. Pelas dores das meias verdades que para ti eram ondas inteiras de esperança. Perdoa-me por não te ter amado nem respeitado nesta parte do fim. Por te ter causado uma dor... que eu sei porque te conheço tão bem... que te vai dilacerar para o resto da vida. Sei que vais andar perdida... que vais desaparecer do mundo porque vais em busca dos porquês... mas sei que um dia... tu voltarás. E vais voltar a viver com uma energia diferente... talvez menos crente. Perdoa-me por guardares de mim... apenas a memória do fim.

Setembro de 2004

14 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Pronto, Querida, eu envio-ta! ;-)

Às vezes, também don´t wanna talk about it! - é um direit que nos assiste, ora essa!

Beijos (mágicos, talvez)!

17/10/05 15:31  
Blogger M. said...

Querida Lemon :o)
enche-me a carta só com esses beijos 'mágicos' ;o)...
Beijos para as duas... mts, mts!!!

17/10/05 15:55  
Blogger sotavento said...

Aposto que a culpa é dos correios!... :)

17/10/05 20:05  
Anonymous Anónimo said...

Trabalhas lá, Sotavento? ...

17/10/05 20:25  
Anonymous Anónimo said...

'Tá bem! (limão cúmplice)

17/10/05 20:26  
Anonymous Anónimo said...

Esta do "'tá bem (limão qq coisa)", não era p'ra aqui! É para outro sítio! - é o blogger que anda louco, não sou eu!

17/10/05 20:27  
Anonymous Anónimo said...

lindo...

17/10/05 22:18  
Anonymous Anónimo said...

No meio de muitas coisas que por vezes leio por aqui, marcas sempre a diferença.
Hoje para azar o meu acertas-te em cheio. Parecia que estava a ler algo que alguém me deveria ter dito.
Deixo-te os meus parabéns e a indiscrição de te dizer que me fizes-te chorar.

Um beijo

18/10/05 01:41  
Anonymous Anónimo said...

Há silencios que dizem muito.
E é preciso coragem para ler neles o que não queremos ouvir.. ainda que digamos que sim.
Não sei se o amor nos cega mas o tempo encarrega-se de tornar tudo mais claro e menos doloroso... felizmente.

Sea

18/10/05 04:15  
Blogger M. said...

SomenteUma
direi que foram sentimentos muito confusos sim... e durante tempo demais. saudade... já não tenho. e o pensamento deveria ter sido partilhado sim.
um abraço

Sotaventinho...
ou isso ou a falta de selo! ;o)
beijinhos

Dona Lemon
mais beijinhos...

obrigado lu

Anónimo(a)
lamento a 'indiscrição' que cometi... e sim, aprendi que por mais que nos custe ouvir... ou dizer o 'não'... é preciso que seja sempre dito.

Sea
se o amor nos cega... hummm, por vezes penso que somos nós que nos deixamos cegar... e às vezes o tempo da claridade demora a chegar.

18/10/05 09:15  
Anonymous Anónimo said...

saravah senhora M.!!!!!!!!!!!!!
eu cá só uso e-mail e mesmo assim atraso-me (será sintomático?)
:) ;)

18/10/05 14:00  
Anonymous Anónimo said...

Miss M.,

Mais uma vez Edward Hopper!! Fantástico!!

Mais uma vez speechless!!!

Bjs!

18/10/05 18:25  
Blogger Francesca said...

Bem...que queres que te diga? Que quando entro nas tuas palavras sinto-as como minhas porque talvez num tempo também foram?

...como uma vez me disseram...inefável....

Beijo grande

19/10/05 12:21  
Blogger M. said...

Miss Tangas...
realmente como me pude esquecer do meilizito???
um abraço

Miss Choco...
saudades!!!
mts, mts beijos !

Cacau
era tão bom que não tivessemos de 'emprestar' estas palavras!!
um abraço fofinho

19/10/05 21:43  

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